terça-feira, 10 de agosto de 2010

Suspiro duma Tarde de Verão

São precisamente 13 horas e 24 minutos. A janela do meu olhar embaciado olha para o verde seco, abafado dos montes pelos quais o meu espírito anelava há demasiado tempo, há séculos, os séculos que me mudaram lentamente, neste vertiginoso turbilhão de meses que parecem longos anos, prolongados no sofrimento de cair sucessivamente nas poças sujas e enlameadas que minam as calçadas duma sombria cidade. Pinto os meus sonhos acordados em tons de cinzento, utilizo as suas diversas graduações, exactas correspondências à melancolia crescente e ominosa que já não sei rejeitar, que já não tenho arte para esquecer.
Olho através da água que cai em pleno Agosto (água salgada, que cava leitos de ribeiros corporizados nas rugas precoces que rasgam a pele imberbe do meu rosto), dou significado e forma às sombras esborratadas que surgem perante mim, discirno o sublime do mundo em meu redor... A Natureza é demasiado perfeita para que exista um Deus... Até porque se ele existisse, era o maior sacana à face da Terra... E cá está, o meu pequeno devaneio absurdo e egocêntrico, o vómito das minhas entranhas sob a forma de letras infinitas e ocas, ridiculamente conjugadas numa especulação traçada no desespero duma manhã vaporosa, a cavalgar ainda na leveza do sopro espirituoso de vinho verde que me tolda a racionalidade deturpada.
Cerro as pálpebras da minha alma, adormeço no doce enlevo das horas sem futuro nem propósito, na ofegante respiração do peito apertado pelo calor obsceno, enquanto nos meus tímpanos ecoam incessantemente os decibéis do meu mp3, que debita a poesia triste e desiludida das músicas criadas por Matt Berninger, acordes sinónimos de tudo o que neste momento sinto ... Ergo os olhos para o nada, e traço no céu azul a infantil e ingénua esperança criada por um sorriso perdido, por um encontro fortuito, pela quimera que quero encontrar mas que não conheço, pela ilusão dum estranho e irreal olhar partilhado. Às vezes julgo que o mundo inteiro não é mais do que uma enorme floresta, cheia de caminhos traiçoeiros, de encruzilhadas, de recantos obscuros, de reencontros imprevistos. O desafio é escolher o trilho certo. E talvez, com um pouco de sorte, encontrarei novamente um laivo de felicidade, tropeçando na beleza da tua face, descoberta e perdida por entre fugidios relances. Talvez te vislumbre para lá da névoa que me intoxica, para lá das sombras perante mim. Talvez no final da estrada te encontre, do mesmo modo que te encontrei no início deste capítulo. Talvez por entre o cheiro do éter e os salpicos de sangue que me mancham a roupa oiça uma vez mais a tua voz. Talvez...

5 comentários:

  1. Soberbo, grande amigo. Eu já te vi escrever muito bem e tu sabes. Mas soberbo.

    a ponto de assoberbares mais um dos nossos caros anónimos xD

    é gente com tanta falta de estaleca...

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  2. Mais não? Só lê quem quer!
    Estes nossos colegas quiseram partilhar a sua arte! Acho muito bem!
    E digo já que tiveram uma ideia muito engraçada.

    Continuem!

    Beijinho amigo *

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  3. Muito e muitos obrigados :D
    isto é que dá força!
    dava era mais um bocadinho se não fosse anónimo, vá lá, WAVE YOUR FLAG sem vergonha :D

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  4. esqueci-me de assinar... sorry.

    Magui =)

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